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domingo, 6 de janeiro de 2013

Entrevista: Desire

Considerados um dos grupos mais únicos saídos do panorama metálico nacional, os Desire regressaram aos palcos para duas datas especiais em celebração dos seus 20 anos de carreira. No fim do concerto do Porto, conversámos com Tear e Flame sobre o passado, presente e futuro da banda.

Depois de duas datas de celebração dos 20 anos de Desire, qual é o balanço que fazem deste retorno aos palcos?
Tear: Um balanço extremamente satisfatório, porque foram duas grandes noites. Duas noites únicas, tal como prevíamos e esperávamos. Penso que, da nossa parte, conseguimos proporcionar isso da melhor forma a todos os que compareceram nos concertos. Da nossa parte foi algo mesmo de muito, muito especial. Espero que também o tenha sido para quem esteve presente nestas duas datas, porque, para nós, foram os concertos mais especiais que demos em toda a nossa carreira. 20 anos de uma banda de metal em Portugal não é fácil… não é mesmo nada fácil, ainda para mais num estilo um tanto ou quanto mal tratado em Portugal.

Há uns meses atrás, entrevistei o John Paradiso, dos Evoken. Perguntei-lhe quando vinham a Portugal e ele respondeu que gostaria muito de regressar e, acima de tudo, voltar a ter a oportunidade de tocar com os Desire. O que sentem perante estas palavras?
Tear: Em 2003, quando tivemos a oportunidade de fazer uma digressão com os Evoken e os Officium Triste, eles (os Evoken) confidenciaram-nos que, desde que ouviram o “Infinity…”, o nosso primeiro trabalho, nos tornámos uma banda de referência para eles e uma forte inspiração no som que fazem. Obviamente que, na altura, isso nos deixou bastante satisfeitos e orgulhos. Foi extremamente gratificante saber que uma banda dos E.U.A., que vagueia pelos mesmos meandros musicais que os Desire, nos tinha como referência. Também ansiamos pelo dia em que eles regressem para voltarmos a estar juntos em palco. Não só com eles, mas também recordar os tempos com os Officium Triste. Toda essa digressão foi extremamente positiva e gratificante…
Flame: Houve um grande espírito de camaradagem e as recordações que temos são as melhores. Parece que os Evoken têm a mesma opinião e, por isso, seria muito bom partilhar um palco ou uma tournée com essas duas bandas.

Qual é o balanço que fazem destes 20 anos?
Tear: Tivemos alguns momentos complicados. Talvez tenham sido mais os momentos complicados do que os momentos bons. Foram 20 anos difíceis, muito atribulados, com várias entradas e saídas de membros, problemas pessoais à mistura… Felizmente, ao fim destes anos todos, conseguimos o mais importante, que foi manter a personalidade e a identidade da banda. Penso que isso se conseguiu muito graças ao facto de a espinha dorsal da banda se ter mantido junta ao longo deste tempo todo. Refiro-me a mim próprio, ao Flame e ao Mist, que somos os três elementos que permanecem desde o início. Todos os outros, infelizmente, foram saindo e foram entrando. Isso deveu-se a problemas pessoais, a incompatibilidades entre a vida pessoal e a vida da banda… Nos Desire, desde o início que sempre tivemos esta mentalidade e filosofia: as pessoas não integram a banda simplesmente pela sua capacidade técnica, mas essencialmente pelo seu espírito, feeling, entrega e pela forma como se identificam e reconhecem no som da banda. Como costumo dizer, Desire não é uma banda vulgar, não é uma banda feita de factos e detalhes triviais, mas sim uma banda especial. Pode não ser uma banda grande, mas é de certeza, e eu tenho essa convicção, que é uma grande banda.


Lembro-me de falar com o Hrödulf, dos Azagatel, e ele dizer que a mudança constante de membros é uma das piores coisas que pode acontecer a uma banda, porque torna as coisas muito complicadas ao teres que estar constantemente a lidar com pessoas diferentes. E a única forma de contornar esse problema era através de muita perseverança e um amor genuíno. Este parece ser um problema da cena nacional. Concordam?
Flame: Quando as pessoas abraçam um projeto, tem mesmo que ser de corpo e alma. Não pode ser abraçado como um passatempo ou como um hobbie. Todos nós passámos por uma idade onde era "cool" ter uma banda e, muitas vezes, essas mudanças de formação acabam por se refletir, porque as pessoas passado algum tempo começam a ver que não têm andamento para isto, que não é isto que realmente querem fazer das suas vidas e acabam por sobrepor outros interesses aos da banda. Isso resulta na constante troca de membros. É muito difícil encontrar pessoas que estejam todas vocacionadas para o mesmo estilo, principalmente no nosso caso, que temos um som muito específico. É fácil encontrar guitarristas e bateristas de Thrash Metal. É conforme as “ondas” do metal, em geral.

Consideram que estas alterações na formação contribuíram para que os Desire tenham lançado apenas quatro trabalhos em 20 anos de carreira?
Tear: Sem dúvida. Se recuarmos no tempo, obviamente que hoje em dia falta um ou outro elemento e, mesmo assim, consegues fazer as coisas. Até a própria gravação de um disco se tornou muito mais fácil com a chegada da era digital. Na altura, e estamos a falar desde 1992, quando ainda se trocavam cassetes e a Internet ainda não era utilizada de forma massiva, tudo era mais rudimentar, mais caseiro, mais arcaico. Tudo era mais…
Flame: Por um lado, mais genuíno e mais verdadeiro até.
Tear: Hoje em dia, talvez a ausência de um membro já seja não tão preponderante para que a banda não possa avançar com a gravação do disco. Quando falo nisto, também quero dizer que antigamente, quando faltava um membro, isso trazia não só consequências nível de formação, mas também a nível monetário. Todos nós fazíamos contas para fazer a gravação e faltar uma pessoa já era um arrombo enorme nas finanças de uma banda. Atualmente, isso já não tem um impacto tão grande e a verdade é que estes 20 anos nos deram um know-how, uma confiança e uma capacidade maiores para fazer coisas que não conseguimos anteriormente.

O vosso último trabalho foi editado em 2009. Sei que já começaram a trabalhar em material novo. Para quando um novo disco dos Desire?
Tear: Estamos a fazer todos os possíveis para que consigamos, no máximo, em Março do próximo ano começar a gravar o novo disco para que seja editado no Outono de 2013. Para nós, seria interessante conseguir fazê-lo mais cedo, mas não queremos estar a criar falsas expetativas, nem estar a defraudar as próprias expetativas das pessoas. Vamos participar no próximo ano, em Maio, no dia 11, num festival na Holanda. Vamos querer aproveitar a oportunidade para fazer outras datas, como fizemos em 2003. Seria bastante proveitoso para nós se já levássemos um novo disco na bagagem, mas estamos a ver que essa meta poderá ser algo complicada de atingir. Daí sermos um bocado realistas, sempre o fomos, e as pessoas perceberem essa parte do porquê de não editarmos trabalhos de forma mais regular. Sempre fomos pessoas muito responsáveis e ponderadas. Sempre pensámos nas coisas com o máximo de concentração e com a certeza absoluta que estávamos a fazer exatamente aquilo que queríamos fazer.
Flame: Tem que ser um digno sucessor, senão não vale a pena.
Tear: Levamos bastante tempo a compor, não porque tenhamos dificuldade em criar novas músicas, mas porque nem sempre nos conseguimos rever nessas músicas, nem exprimir na plenitude tudo o que queremos transmitir. Damos imensas voltas nas coisas para que elas fiquem exatamente como queremos.
Flame: Algo que resume o que o Tear está a dizer é que, acima de tudo, somos nós os nossos maiores críticos. Nem tudo aquilo que sai na sala de ensaios é visto como terminado Só avançamos quando estamos realmente satisfeitos. Relativamente ao próximo trabalho, neste momento temos cerca de 70% do material pronto. Os restantes 30% são aqueles pormenores que precisamos para ficar completamente satisfeitos.


Notou-se que deram muita atenção ao “Infinity…” nesta celebração. É um álbum muito especial não só por ser marcante para a cena portuguesa, mas também por ser visto como uma peça de coleção em todo o mundo. Como é para vocês ter um trabalho como este na vossa discografia?
Tear: Penso que o “Infinity…” acabou por conquistar aquilo que lhe era naturalmente devido, porque foi o primeiro disco de Doom Metal em Portugal. Fomos pioneiro e penso que foi uma viragem no Metal em Portugal. Daí que nos primeiros tempos não tenha sido muito bem aceite, mas também sabíamos que seria difícil digerir. Porém, tínhamos a convicção que, quando as pessoas percebessem exatamente o que os Desire queriam transmitir, se iria tornar numa referência para os ouvintes, assim como para muitas bandas que viessem a surgir depois. Foi um disco que nos marcou imenso, éramos muito jovens na altura. Estávamos cheios de energia e ideias. Não quisemos partilhar o disco com ninguém, ou seja, não quisemos envolver ninguém na sua composição e elaboração. Foi um trabalho bastante ambicioso e puro. Todos os trabalhos de Desire têm um significado muito especial, porque todos eles marcam uma fase das nossas vidas, dos nossos sentimentos e das nossas intenções. Hoje estamos a falar do “Infinity…” e, sinceramente, acredito que, com o passar dos anos, o “Pentacrow” e o “Locus Horrendus” também vão conquistar o seu lugar. Pessoalmente, penso que o “Locus Horrendus” é o disco que traduz de melhor forma a verdadeira essência e identidade dos Desire. É a pérola negra da banda, porque é o disco mais sinistro, mórbido, sentido, profundo e introspetivo de sempre. Está ligado a emoções muito fortes.

Há planos para uma reedição do “Infinity…”?
Tear: Há planos para uma reedição tanto do “Infinity…”, como do “Pentacrow” e do “Locus Horrendus”.

Falou-se inicialmente de uma box set…
Tear: Sim, a “The Trilogy of Melancholy”. Posso adiantar que isso ainda não foi feito por duas grandes razões. Uma, que é a mais importante de todas, por ainda estarmos a resolver pequenas questões com a Skyfall Records, a editora que lançou o “Infinity…” e o “Pentacrow”. A outra é o facto de querermos terminar, e isto é uma convicção e desejo pessoal, o conceito que iniciámos no “Infinity…”, que é, no fundo, transversal a todos os trabalhos dos Desire. Há três grandes trabalhos que marcam esse conceito, que são o “Infinity…”, o “Locus Horrendus” e a terceira parte que ainda está para sair, ou seja, o próximo álbum. Aí, sim, penso que será a altura ideal para lançar a “The Trilogy of Melancholy” com esses três discos, deixando os dois EPs de lado. E, como já devem ter reparado, há outra característica especial na banda que faço questão de manter. Todos os discos de Desire têm um subtítulo comprido e procuramos sempre fazer trocadilhos nos títulos dos EPs com aquilo que mais nos marca e simboliza, ou seja, a figura do corvo. Tanto o “Pentacrow” como o “Crowcifix” são muito focados na figura do corvo, porque são trabalhos mais exclusivos, mais focados nos fãs e não tanto no público em geral. Daí até termos editado o “Crowcifix” em vinil, porque, ao longo dos anos, fomos recebendo vários incentivos para que isso acontecesse. Isso para nós fez todo o sentido, porque pertencemos ao underground e nunca tínhamos editado um vinil. Teve que ser em ’12, porque não cabia noutro formato. (risos) Às vezes, as pessoas pensam que escrevemos temas longos de propósito, mas não é verdade. Isso acontece, porque…
Flame: Não conseguimos transmitir certos estados de espírito e ambiências em apenas cinco ou dez minutos.

Já que falam nisso, voltemos a falar sobre o concerto. É incrível como os Desire conseguem transformar um concerto de 1h45 em algo que parece tão curto. Para isso contribui a forma como vocês deixam as vossas músicas respirar.
Flame: Tocámos 1h45 e ainda nos disseram que soube a pouco.
Tear: Sim, é isso mesmo que estás a dizer e isso reflete-se na música.
Flame: E ainda bem que as pessoas reconhecem isso, que não se torna maçador pelas música serem grandes e por haver vários estados de espírito e ambiências…
Tear: Por acaso, esse foi um dos nossos grandes receios quando estávamos a preparar estes concertos. Ficámos com o receio de ser um alinhamento demasiado longo e maçador. Pensámos até em reduzi-lo quando estávamos na sala de ensaios. Daí termos feito o encore, para ver se  as pessoas tinham realmente vontade de ouvir mais. Confesso que, nestes dois concertos, saímos sempre do palco com a certeza de que as pessoas queriam que voltássemos. É óbvio que isso nos deixa extremamente satisfeitos e é algo muito gratificante. Estas são, sem dúvida, duas noites que ficarão nas nossas memórias e espero que também fiquem na memória de todos os que estiveram presentes nestes dois concertos. Foram especiais e únicos, tal como esperámos. Há imenso tempo que não tocávamos um alinhamento tão longo…
Flame: E em nome próprio.
Tear: É uma pena que não tenham comparecido mais pessoas, mas, mesmo assim, penso que o balanço é extremamente positivo. São conquistas que se fazem passo a passo.
Flame: Só fez falta quem cá esteve, como se costuma dizer. Quem queria estar, esteve num dos espetáculos e só perdeu quem não esteve.
Tear: Fiquei feliz pelo carinho que tivemos das pessoas no final dos concertos e por tudo o que nos transmitiram. Tudo isto, parecendo que não, vai-nos alimentando a alma e o ego. Não no sentido de acharmos que somos bons, mas para nos dar forças para continuar…
Flame: E nos fazer sentir que estes 20 anos têm valido a pena. Nunca imaginámos que ainda estaríamos no ativo passado tanto tempo, especialmente em Portugal. Já muitas pessoas nos disseram que o nosso azar foi os Desire terem nascido em Portugal e que, se tivesse sido noutro país, talvez tivéssemos mais reconhecimento. Nós reconhecemos isso, achamos que isso seja possível, mas temos dado sempre o nosso melhor.
Tear: Fica um amargo na boca por não termos feito mais e chegado mais além…
Flame: Ainda não é tarde.


Pelo menos, sentem-se realizados com o que fizeram até agora. Muitas bandas não o podem dizer.
Flame: Sem dúvida, principalmente por nunca termos feito nada forçado e que soasse falso. O que já saiu é algo que vem de dentro. Ouvimos constantemente pessoas a perguntarem o porquê de demorarmos tanto tempo a lançar um álbum, mas ele só sai quando achamos que deve sair. Com todas as dificuldades que tivemos, podíamos ter optado por encerrar atividades, mas sempre acreditámos com a mesma crença que tínhamos há 20 anos quando formámos a banda.
Tear: Só queria referir algo que penso não ser muito comum em Portugal, infelizmente. Nestes dois concertos fomos acarinhados e abraçados com a presença de várias pessoas que vieram de propósito do estrangeiro para estarem presentes nesta celebração dos 20 anos de Desire. Pessoal da Alemanha, Rússia, França, Inglaterra... Fazer isto com uma banda portuguesa que, no nosso caso não tem muita exposição ou promoção internacional, espelha o que os Desire conseguiram ao longo destes anos. Não só fazer parte da vida de muitas pessoas em Portugal, como também no estrangeiro. Recebemos constantemente incentivos e convites de muitas pessoas lá fora para que levemos a música dos Desire aos palcos espalhados pelo mundo. Infelizmente, como é do conhecimento geral, não é fácil concretizar essas coisas, mas sentimos que temos fãs espalhados por todo o mundo. Faltam-nos as infraestruturas e o apoio para podermos chegar mais além. Gostávamos de correr o mundo e proporcionar a essas pessoas a hipótese de assistirem a um concerto nosso, até porque foi por causa dos nossos fãs que não desistimos. Ainda temos muito para dar e para contar em termos de conceito lírico. Penso que é uma história interessante e faço votos para que, um dia, talvez quando a banda terminar, todo este trabalho seja aproveitado para um argumento de filme. A banda-sonora já está feita, só falta mesmo retratar tudo isto em imagem. Penso que resultaria em algo profundo e muito bonito, por isso fica a deixa.

Para terminar, tinham planeado gravar estes dois concertos e vi algumas câmaras na sala…
Tear: Houve pessoas que se ofereceram para fazer a captação de vídeo.
Flame: Mas nada oficial.
Tear: O objetivo era fazê-lo de forma profissional, com várias câmaras e ângulos, para depois podermos fazer uma mistura. Fazer também uma captação de som profissional, porque a intenção era lançar em 2013 um DVD alusivo a estes 20 anos. Não foi possível, mas esse sonho não fica enterrado. Hoje foram estes concertos e, se calhar, daqui a uns anos teremos melhores condições e talvez aí já seja possível tornar esta ideia uma realidade. É algo que se impõe a uma banda como Desire e as pessoas merecem isso. Seria bom poder estar em casa, num momento introspetivo, e sentir um concerto nosso.

Entrevista realizada em colaboração com o Tiago Moreira para a Infektion Magazine.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Ao vivo: Desire

Desire
Hard Club, Sala 2 - 08/12/2012

De regresso aos palcos para comemorar os seus 20 anos de carreira, os Desire vieram atuar no Porto, depois de o terem feito em Lisboa dois dias antes. Já passava das 22h30 quando os lisboetas subiram ao palco da Sala 2 do Hard Club, acompanhados por Dawn, o antigo teclista, e V-Kaos, nas vozes femininas. Foi com “Torn Apart” que deram início ao espetáculo, seguindo-se “Funeral Doomentia”, na qual o vocalista Tear tentou interagir com o público pela primeira vez, mas sem grande resultado. Apesar da competência com que a banda interpretava o seu Doom/Death Metal, ao início chegou a pairar a ideia de que não estava a conseguir fazer passar a sua mensagem, tal era a aparente indiferença dos presentes. No entanto, essa sensação foi-se dissipando aos poucos, dando lugar ao ambiente especial que uma ocasião como esta merecia. Para isso, contribuíram algumas canções do emblemático “Infinity…” e do negro “Locus Horrendus”. Temas como “Leaving this Land of Eternal Desires” e “Forever Dreaming… (Shadow Dance)” arrancaram fortes aplausos e pareceram finalmente despertar a plateia. Após um breve encore, os Desire dedicaram a clássica “The Purest Dreamer” a todos aqueles que os apoiaram ao longo dos seus 20 anos de atividade. No fim, no meio de efusivos aplausos, Tear e companhia começaram a despedir-se, mas o público queria mais. Foi, então, interpretada a relíquia “Death Blessed by a God”, canção da época em que a banda ainda se chamava Incarnated, encerrando da melhor maneira um concerto memorável e envolto de uma mística muito especial.

domingo, 9 de dezembro de 2012

Ao vivo: Anathema, Astra

Anathema, Astra
Hard Club, Sala 1 - 19/10/2012

Depois dos Paradise Lost no início do mês, um Hard Club igualmente bem-composto recebeu outra figura da tríade do Doom Metal britânico dos anos 90: os Anathema. A banda dos irmãos Cavanagh regressou ao nosso país pelo quarto ano consecutivo, desta vez para apresentar o novo “Weather Systems” num concerto que se adivinhou, como seria de esperar, memorável.

Encarregues de dar início ao evento, os Astra começaram a atuar antes da hora prevista e foram muitos, incluindo a nossa equipa, os que perderam o início da sua atuação. Embora não tenha sido possível assistir às duas primeiras canções, “Cocoon” e “The River Under”, houve tempo suficiente para apreciar o Rock Progressivo retro destes norte-americanos naturais da California através de “The Black Chord” e “The Weirding”, que se revelaram autênticas viagens sonoras.

Seguiu-se, então, a principal atração da noite. “Untouchable Part 1” e “Untouchable Part 2” serviram de ponto de partida para os Anathema conquistarem a plateia sem grande esforço, comprovando, mais uma vez, a existência de uma química especial entre a banda e o público português. Nem mesmo as dificuldades técnicas com o equipamento de Daniel Cavanagh em “Thin Air”, “Dreaming Light” e “Everything” prejudicaram o belo início de espetáculo e a boa-disposição que se respirava no recinto. Já com os problemas resolvidos, Vincent Cavanagh anunciou três temas de “Judgement”, interpretados sem interrupções. Entre eles, figurou o clássico “Deep” – dedicado ao público – durante o qual teve lugar um fantástico jogo de luzes. O concerto foi prosseguindo ao som de faixas retiradas de “We’re Here Because We’re Here” e “Weather Systems”, com especial destaque para “A Simple Mistake”, dedicada ao teclista Daniel Cardoso, e a eletrónica “The Storm Before the Calm”, na qual Vincent trocou a guitarra pelos sintetizadores. Contudo, o melhor ainda estava para vir. Depois de uma interpretação muito aplaudida de “Closer”, Vincent pediu que se apagassem as luzes e fosse o próprio público a iluminar a sala com o que tivesse à mão. Com isqueiros e telemóveis no ar, a plateia cantou com os Anathema “A Natural Disaster”, registando ali um momento único e que jamais será esquecido por quem o vivenciou. No fim, Vincent falou sobre a estranha união entre a música criada pela banda e os seus fãs. Já em encore e com o tempo a escassear, o vocalista perguntou qual era a canção que os presentes mais queriam ouvir e, entre os vários nomes que se ouviram, prevaleceu “One Last Goodbye”. Cantada em uníssono, foi mais outro momento incrível numa atuação que viria a terminar da melhor forma logo a seguir, ao som de “Fragile Dreams”. No fim, os irmãos Cavanagh e o resto da banda andavam pelo Hard Club a conversar com os fãs e a tirar fotografias com eles, demonstrando uma humildade que se vê pouco nos dias de hoje.


Fotografia de Susana Cardoso
Reportagem originalmente publicada na Infektion Magazine nº18

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Ao vivo: Paradise Lost, Soen

Paradise Lost, Soen
Sala 1, Hard Club - 04/10/2012 

Os Paradise Lost regressaram a Portugal com data dupla, assinalando assim o início de mais uma digressão pela Europa em promoção do seu 13º álbum, "Tragic Idol". Depois de terem estado em Lisboa no dia 3 de Outubro, os britânicos passaram também pelo Porto no dia seguinte. A acompanhá-los como banda de abertura em ambas as datas estiveram os Soen, que se estrearam no nosso país.

Devido a problemas técnicos, as portas da Sala 1 do Hard Club só abriram às 21h30 e quando os Soen começaram a atuar, ainda uma longa fila esperava para entrar no recinto. Em palco, os suecos apresentaram algumas surpresas a nível de formação, com um baixista substituto a ocupar o lugar de Steve DiGiorgio e um quinto elemento responsável pelos teclados e pela percussão e vozes adicionais. “Fraktal” e “Fraccions” deram o mote a uma prestação seguríssima que pouco demorou a cativar o público. À medida que se iam ouvindo outras canções, como “Delema”, “Oscillation” ou a suave “Last Light”, tanto Joel Ekelöf como Martin Lopez iam assumindo uma posição de destaque, o primeiro pela envolvência com que cantava e o segundo pela complexidade e poder que imprimia na forma como tocava a sua bateria. Já a encerrar um concerto muito aplaudido, “Savia” sublinhou que há neste projeto uma identidade própria mais vincada do que se pensa.



Após meia hora de preparações e já com a sala praticamente cheia, as luzes apagaram-se finalmente e, ao som de “Desolate”, os Paradise Lost foram subindo um a um para o palco sob uma chuva de aplausos e assobios vindos da plateia. Foi ao som da clássica “Widow” que o espetáculo começou, com Nick Holmes a puxar pelo público desde o primeiro instante e a receber uma resposta efusiva. Seguiram-se “Honesty in Death e “Erased”, que corroboraram a excelente entrada do coletivo britânico. Depois, foi altura para um dos momentos mais especiais da noite. As luzes apagaram-se por breves segundos e ouviram-se os teclados iniciais de “Enchantment”, uma surpresa para aqueles que esperavam um alinhamento semelhante ao da noite anterior em Lisboa. Mais uma vez, os presentes mostraram um apoio incondicional à banda, cantando e marcando o ritmo com palmas e heys. Ainda durante a interpretação deste tema, o vocalista recebeu uma ovação depois de ter oferecido duas palhetas a um fã que exibia um cartaz na fila da frente e lhe ter dito que eram “10€, por favor”. Apesar de se ter mostrado sempre bem-disposto e comunicativo, Nick teve dificuldades em imprimir a intensidade necessária nas suas vocalizações, que revelaram algumas debilidades e se afundaram aos poucos no poder dos instrumentos dos outros membros à medida que o concerto decorria. Entretanto, foram-se ouvindo outras canções de um alinhamento eclético q.b. que englobou clássicos como “Pity the Sadness” ou “As I Die”, temas da fase eletrónica (neste caso, “Soul Courageous” e “One Second”) e faixas mais recentes, sendo elas “Praise Lamented Shade” ou “The Enemy”, sem esquecer, claro, novidades como “In This We Dwell” e “Tragic Idol”. Já em regime de encore, foram interpretadas a icónica “Embers Fire”, “Fear of Impending Hell”, “Faith Divides Us – Death Unites Us” e, em despedida, “Say Just Words” que pela última vez naquela noite encheu o recinto de fortes aplausos. É certo que faltaram mais alguns clássicos, mas foram quase 90 minutos de música ao vivo muito bem passados.


Fotografias gentilmente cedidas por Antonio Aguirre (Craneo Metal)

Reportagem originalmente publicada na Infektion Magazine nº18

terça-feira, 19 de junho de 2012

Ao vivo: Cannibal Corpse, Grog, Hunted Scriptum

Cannibal Corpse, Grog, Hunted Scriptum
Hard Club, Sala 1 - 17/06/2012

Depois de cinco anos sem pisar terras lusas, os Cannibal Corpse regressaram finalmente a Portugal para saciar a vontade dos seus fãs de (re)vê-los ao vivo. Na bagagem, o colectivo americano trazia "Torture", o 12º longa-duração de uma carreira consistente e bem-sucedida.

Pouco depois do fim de um emocionante jogo de futebol entre Portugal e a Holanda, os Grog deram início às hostilidades numa Sala 1 já bem composta e que apontava para a enchente. Numa actuação competente e que se ia tornando cada vez mais cativante à medida que decorria, o experiente quarteto lisboeta presenteou o público com a sua descarga de Death Metal com laivos de Grindcore e revelou-se um bom aquecimento para o que aí vinha, arrancando bons aplausos e até algum mosh

Terminados os arranjos e o breve soundcheck, as luzes do recinto apagaram-se e os presentes entraram em euforia à medida que Paul Mazurkiewicz, Pat O'Brien, Rob Barrett, Alex Webster e Corpsegrinder entravam em palco. A abrir, "Demented Aggression" instaurou o headbang e o mosh, notando-se desde logo o bom som que saía das colunas do Hard Club. Seguiram-se, quase sem interrupções, "Sarcophagic Frenzy" e "Scourge of Iron". A partir daqui, os Cannibal Corpse começaram a interpretar canções de todos os seus discos, destacando-se "The Time to Kill is Now" e "I Cum Blood", que atingiram níveis de intensidade bem altos. Bem-humorado, Corpsegrinder dialogou com o público e ainda dedicou "Priest of Sodom" a todas as mulheres presentes. Guardadas para o fim ficaram a icónica "Hammer Smashed Face" e "Stripped, Raped and Strangled", encerrando um poderoso concerto da banda americana que não deve ter deixado ninguém insatisfeito.

Com sensação de dever cumprido e com uma longa viagem de regresso pela frente, foram vários os presentes que começaram a abandonar a Sala 1 enquanto se faziam os preparos para a última actuação da noite.  Já passava das 0h35 quando os bracarenses Hunted Scriptum começaram a tocar e, apesar de contarem com menos espectadores, mostraram-se a bom nível. Vestidos a rigor com batas de cirurgia e o vocalista preso num colete-de-forças, debitaram o seu Death Metal de forma convincente, motivando os resistentes a esgotar as energias que ainda lhes restavam.